Universidade Feminista
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Universidade Feminista

As mulheres que estiveram na linha de frente das greves e ocupações de universidades têm tido um papel fundamental em defesa da educação.

Adriana Herz Domingues 18 out 2019, 00:11

Até os anos 70, as mulheres eram apenas um quarto dos universitários. Menos ainda eram aquelas que, como Eliza Frota Pessoa ou Lélia Gonzalez, conseguiram alguma forma de destaque. Hoje somos 57,2% dos estudantes matriculados em cursos de graduação e quase metade dos professores universitários. Além disso, com a conquista das políticas de cotas, cada vez mais mulheres negras e da classe trabalhadora têm tido acesso à educação superior, produzindo e racializando o conhecimento nas universidades públicas do Brasil. Mesmo que ainda haja uma grande restrição em relação às áreas que as mulheres ocupam no mundo acadêmico – é muito mais comum vermos elas em cursos relacionados ao cuidado do que em cursos como física ou economia – nossa presença na educação é inegável. Esse crescimento é um resultado da luta feminista e tem impulsionado a luta e elaboração política que permitiu que a primavera das mulheres explodisse no Brasil. Foi por exemplo, através da elaboração científica que pudemos afirmar que o embrião não sente dor antes dos três meses e avaçar na luta pela legalização do aborto.

Desde 2015, nossas universidades estão assistindo às suas verbas sendo cortadas. Essa política se agravou com a PEC do Fim do Mundo de Michel Temer, que congelou os gastos públicos por um período de 20 anos.  Para termos uma ideia,  a Educação pode ter perdas no Orçamento de até R$ 25,5 bilhões por ano, segundo estudo técnico da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados. Agora, com o governo Bolsonaro, a educação pública vem vivendo seus piores dias nas últimas décadas. O ministro Weintraub bloqueou, no final de abril, 30% do orçamento das 63 universidades e dos 38 institutos federais de ensino. Não satisfeito, Bolsonaro e seu ministro apresentaram o projeto Future-se que, caso seja implementado, significará a destruição e total financeirização da educação brasileira. Sabemos que os primeiros que serão afetados pelos cortes e pela crise serão aquelas e aqueles que mais recentemente entraram nas universidades e que nela têm mais dificuldade de permanecer. Se não há creches universitárias, cada vez menos há creches públicas e mães são obrigadas a largar os estudos, a precarização dos transporte público, a diminuição das bolsas de assistências estudantil e de pesquisa, nos expulsam pouco a pouco das paredes tão altas das universidades públicas. Ao mesmo tempo, o machismo, racismo e lgbtfobia que tem crescido como resposta ao engrandecimento de nossas lutas nos coloca em maior situação de violência para estar nesses espaços.

As mulheres que estiveram na linha de frente das greves e ocupações de universidades têm tido um papel fundamental em defesa da educação. Temos consciência de que aqui chegamos com muita luta e não vamos abrir mão de nossas conquistas. Na conjuntura em que vivemos, é necessário que coloquemos toda a força da primavera feminista em movimento para garantir nossos avanços históricos, e o acesso à universidade é uma das maiores delas. As feministas têm conseguido ser, junto com a juventude, o mais importante front de resistência ao assenso de governos de extrema direita pelo mundo. Isso se deve ao fato de não ser um movimento que simplesmente se pauta pela negação a um projeto ou então por um apego a experiências do passado. O movimento feminista tem sido o grande antagonista das experiências conservadoras porque tem conseguido pautar um novo modo de vida em que coloca a solidariedade e a comunidade acima do individualismo capitalista, que nega a violência entre irmãos e entre povos, que afirma a necessidade dos espaços coletivos e da tomada de decisão democrática. É desse feminismo que precisamos falar quando debatemos a resistência aos cortes nas universidades públicas, porque não basta negar o desmonte que vivemos, precisamos afirmar também o que queremos.

Por um lado, é necessário afirmar a importância daquilo que fazemos nas universidades públicas. Nas nossas universidades pensamos e publicamos sobre problemas de saúde pública como a zika, pesquisamos e produzimos sobre vacinas, investigamos e elaboramos sobre as populações tradicionais, estudamos e desenhamos planejamento urbano, pensamos e produzimos sobre sofrimento psíquico. Por outro lado, é necessário reconhecermos que a universidade pública ainda é muito restrita e que a maior parte das filhas e filhos da classe trabalhadora estuda em universidades privadas ou mesmo não acessa o ensino superior. Precisamos quebrar os muros da universidade pública para que cada vez mais mulheres, negras e indígenas estejam do lado de dentro e que algum dia os muros da universidade deixem de existir. Além disso, as universidades ainda têm muito pouco diálogo com o conjunto da população. É preciso criar cada vez mais espaços em que possamos escutar as demandas daqueles que não acessam os espaços universitários e produzir conhecimento junto a eles. Dessa forma, as universidades estariam menos interessadas em elaborar produtos para o lucro de empresas privadas e mais interessadas em pensar soluções para os problemas do dia a dia das trabalhadoras e trabalhadores como os crescentes índices de feminicídio, as mortes do filhos das mulheres negras e faveladas para a violência do Estado e as intermináveis filas do SUS que nós mulheres temos que enfrentar com nossos filhos e familiares.

Se somos nós que estamos reinventando as lutas pelo mundo e apontando a saída para uma sociedade onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e completamente livres, somos nós também que estaremos a frente da luta por uma universidade feminista!


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