Agosto Lésbico com Nicinha e Jurema
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Agosto Lésbico com Nicinha e Jurema

Reflexões a partir de um cineclube do quinto episódio de Meu amor: seis histórias de amor verdadeiro.

No início de julho, o Núcleo de artistas feministas do Coletivo Juntas RJ, o Arte Delas,   organizou um cine debate com a proposta de refletir, a partir de um documentário, os afetos de mulher para mulher. A escolha de passar o 5° episódio de “Meu amor: seis histórias de amor verdadeiro” não foi à toa, é uma raridade encontrar na indústria cinematográfica convencional a história de pretas se amando.

Nicinha e Jurema são duas mulheres que se encontraram quando a Rocinha era de fato uma roça, há mais de 40 anos atrás. O documentário mostrou como foi o ano do casal: o trabalho, a casa, as dificuldades, as conquistas familiares, as trocas de carinho e afeto. Apesar de falar sobre amor, o episódio está longe de ser um romântico filme hollywoodiano; também não cai no clichê taxando a vida de pessoas LGBTQIA+, negros e negras como uma grande tragédia. Amor não é algo puramente mágico; muito menos deve ser sinônimo de  sofrimento eterno – como é colocado na famosa frase “ele fez isso porque te ama”.

Desde o nosso nascimento somos designadas ao que devemos ou não fazer, recebemos diariamente o manual do que são coisas de uma boa menina e cada regra não seguida dificulta a nossa vida. Numa tentativa de coerção, violências psicológicas, físicas e verbais são utilizadas. Mulheres são estupradas e mortas muitas das vezes por amarem outra mulher, o chamado “estupro coercitivo” na realidade é uma das vias que o patriacardo tem de nos lembrar que somos melhores mortas do que fora do padrão dele.  

Amar e deixar ser amada não é uma tarefa fácil. O amor (especialmente o amor próprio) parece exigir reflexão sobre quem somos, quais são nossos desejos e fantasias. Fora a gigantesca pressão que colocamos sobre nossas vidas, nossos dilemas existenciais e as correrias do dia a dia. A sociedade não aceita que duas mulheres pretas e periféricas se amem, não só por serem duas mulheres, mas porque duas mulheres pretas se amando subverte a lógica racista de que o corpo preto não é passível de ser amado. Nossa autonomia fere a lógica deles. Ou bancamos os nossos desejos, ou estamos fadadas ao enfraquecimento das nossas experiências sociais, e a constante sensação de culpa e angústia. Mulheres do mundo, amemos!

O que muitas vezes é perceptível é que nossas emoções podem ser um diagnóstico social de que algo está errado, e sabemos que está. A história de Nicinha e Jurema nos fez pensar sobre o tempo, cidade, classe, raça, gênero, política e envelhecimento; e deixaram algumas questões. Você conhece um casal de mulheres idosas? Costuma ver mulheres negras trocando afeto na rua? Quais dificuldades e limitações que as cidades, as estruturas urbanas ou rurais, trazem para construirmos nossas famílias (no sentido tradicional ou não)? Como as políticas públicas definem as nossas trajetórias de vida?

O capitalismo arranca cada segundo de uma possível tranquilidade no nosso dia e joga para criar lucro, separar um momento do seu dia, da sua semana, para você assistir um filme, fazer algo que gosta ou ficar no maravilhoso ócio improdutivo, parece uma grande auto revolução. Esperamos que a pessoa que estiver lendo isso possa tirar um tempinho para si, e convidamos para que assistam esse documentário e façam o mesmo experimento de compartilhar suas vivências e emoções.

Dia 29 de agosto é dia de luta e a nossa luta vai muito além do direito de amar. Não queremos ser toleradas, não queremos que gostem de nós.  Exigimos políticas públicas que priorizem as nossas vidas. Que os nossos assassinos, assediadores e estupradores sejam responsabilizados e não mais exaltados!


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