Uma primeira experiência com a Marcha das Margaridas
Foto: Rebeca Meyer

Uma primeira experiência com a Marcha das Margaridas

Nossas impressões políticas.

Nos dias 15 e 16 de agosto, a 7ª Marcha das Margaridas ocupou as ruas de Brasília. Mais de 100 mil mulheres – 150 mil segundo a organização – se reuniram vindas de todos os estados do Brasil, em especial do Nordeste. Foi nossa primeira experiência de contato mais próximo com essa mobilização e escrevemos este texto para compartilhar algumas impressões.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer o quão massiva é a Marcha das Margaridas. São milhares de trabalhadoras rurais e agroextrativistas, em sua maioria mulheres pobres e negras, que vão a Brasília para se encontrar, debater e lutar. São, em grande maioria, mulheres do campo, mas também mulheres das florestas, das águas e das cidades, com uma imensidão de experiências, saberes e fazeres diferentes sendo compartilhados. Dessa forma, o primeiro dia da Marcha é um espaço de aprendizagem e acolhimento para muitas. O pavilhão do Parque da Cidade foi ocupado por tendas com plenárias, mesas e oficinas de diversos temas (agroecologia, violência contra mulher, saúde da mulher, educação do campo, Amazônia, entre outros), além de uma feira livre com produtos levados pelas comitivas, com representatividade de todos os estados.

É importante destacar a dispersão política do espaço além do peso da linha governista no evento. A mesa de abertura, primeiro espaço político centralizado do encontro, teve como tônica a exaltação ao governo, com falas de ministros e ministras, por exemplo, além da presença de outras figuras da política institucional, como da parlamentar estadunidense Alexandria Ocasio-Cortez. Ainda assim, a banquinha de materiais organizada pelo Juntas com cartilhas, livros e folhetos fez muito sucesso pela propagação de um feminismo anticapitalista e militante e pelo reconhecimento do PSOL enquanto um aliado da luta do campo, demonstrando que há muito espaço para a construção da nossa política neste contexto. 

No segundo dia, 16 de agosto, aconteceu o grande momento da Marcha: a caminhada do Parque da Cidade até a Esplanada dos Ministérios. A passeata terminou em frente ao Congresso Nacional, em um grande palco onde discursaram Lula, ministros e representantes da CONTAG. Importante notar que o ato da Marcha não é organizado por blocos de forças políticas. As mulheres marcham em uma divisão por estados, a fim de representar a diversidade cultural e regional presente na Marcha. No entanto, parece haver um sentido de despolitização nesse arranjo. Além disso, os principais eixos políticos de intervenção no ato e na carta de reivindicações apresentada ao presidente eram bastante vagas, apontando para uma postura de grande composição da direção do processo (encabeçada pela CONTAG) e o governo. Essa é uma demonstração sobre a necessidade de trabalhar por uma marcha que consiga ter maior independência política em relação aos governos, possibilitando a apresentação de reivindicações mais concretas e centrais, como recolocar no centro da luta das organizações do campo o avanço da Reforma Agrária.


A decisão de participarmos de maneira organizada desta edição da Marcha das Margaridas se deu por um conjunto de fatores: a importância de atuarmos em um dos maiores atos de mulheres da América Latina, a deliberação da Setorial Nacional de Mulheres do PSOL de enviar delegações ao encontro, pelo destaque que a nossa deputada Sâmia Bomfim vem tendo na CPI do MST e pela proximidade que conseguimos estabelecer entre companheiras da Coordenação Nacional do Juntas, da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL) e do Movimento Liberdade para os Sem Terra (MLST). A partir de então, começamos a debater e formular de maneira mais profunda sobre a importância da luta pela Reforma Agrária, o que culminou na elaboração da cartilha “Mulheres pela Reforma Agrária: Em defesa dos movimentos sociais”.


Reunimos cerca de 70 companheiras do Juntas! – entre elas algumas que também militam no Juntos! e na Rede Emancipa – FNL e do movimento extrativista e agroecológico do Amazonas, todas em um alojamento próprio, viabilizado pelo apoio do mandato do companheiro Fábio Félix, possibilitando maior entrosamento e troca de experiências da nossa militância. Com nossa faixa “Mulheres pela Reforma Agrária: Em defesa do movimento sociais” e uma agitação com uma batucada feminista animada, fomos a maior e mais organizada força do PSOL presente na Marcha, demonstrando a unidade na luta sem perder a chance de apresentar uma política própria. Reivindicamos a atualidade e a urgência da Reforma Agrária e, diferente do que preconizava o mote oficial da Marcha, não lutamos pela “reconstrução do Brasil”, mas pela construção de um Brasil que nunca foi, pelas mãos das mulheres que colocam comida na mesa dos brasileiros.

Ainda que esse tenha sido nosso primeiro contato com a Marcha das Margaridas, não podemos deixar de apontar que se perdem oportunidades políticas que do nosso ponto de vista são essenciais: na maior ação organizada por mulheres da América Latina, mais do que um evento onde milhares são levadas para referendar ações do governo, era possível aproveitar um espaço tão qualificado para a consolidação de um programa de luta das mulheres do campo e da cidade que, depois de longos anos na defensiva, precisam avançar na conquista de direitos. A luta pela Reforma Agrária, em nossa opinião, precisa seguir sendo ponto central de reivindicação. ‘Quando o campo não planta, a cidade não janta’, é mais que uma frase de efeito, é uma realidade. Diante do avanço dos ruralistas no Congresso Nacional, aprovando suas pautas e atacando os movimentos do campo, é preciso lembrar que o agronegócio não produz comida, mas produz commodities, e que os maiores responsáveis por colocar comida na mesa do povo brasileiro, são os pequenos agricultores. Dessa forma, defender a Reforma Agrária é garantir a alimentação do povo brasileiro, e um Brasil mais igualitário. 

Saímos da Marcha das Margaridas com um trabalho de mulheres fortalecido pela experiência com esta importante mobilização, pela relação com os movimentos de campo – em especial com o trabalho de Diolinda Alves e Débora Firmo no Pontal do Paranapanema em SP – e com uma equipe mais formada e madura. Esperamos seguir participando da Marcha das Margaridas no futuro, com cada vez mais capacidade de intervir politicamente junto às mulheres que participam da Marcha, apresentando a necessidade de um feminismo anticapitalista e antirracista que seja consequente com a luta pela Reforma Agrária e de um partido que possa dar voz a essa luta.


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