Agitação e propaganda feminista
Relato de uma oficina no Rio de Janeiro.
No sábado, dia 13 de março, O Juntas RJ organizou uma oficina de agitação e propaganda feminista como parte da semana do 8 de março. Nessa oficina, diversas mulheres se encontraram para debater como a agitação e a propaganda podem ser ferramentas de um feminismo das 99%. Definimos inicialmente dois objetivos: 1. Mobilizar as massas de mulheres trabalhadoras do Brasil em direção a pautas feministas, antirracistas e anticapitalistas; 2. Organizar o movimento feminista e o Coletivo Juntas. Conceituamos propaganda como “muitas ideias para poucas pessoas”, vai desde uma conversa simples e individual até uma formação ou curso, como o Lendo Juntas. Já a agitação é “uma ideia para muitas pessoas”. Encontramos uma palavra de ordem ou expressão artística que possa passar de maneira simplificada o que queremos conquistar ou como queremos alcançar nossos objetivos. Um exemplo seria o chamado “pela vida das mulheres”, que usamos para defender a legalização do aborto.
Na Revolução Soviética é possível encontrar grandes exemplos de agitação e propaganda e é interessante observar como o processo se desenvolve desde 1905 até 12 anos depois quando a revolução acontece. Antes foi necessário entender o cenário: A população era majoritariamente analfabeta, havia muita violência, o território era extenso e a comunicação entre os lugares demorava. Muitas agitações criativas foram criadas, um exemplo seria o trem de agitprop soviético. Eram divididas equipes para comício, música, dança e teatro que viajavam pelo país para organizar e informar os trabalhadores urbanos, camponeses e soldados. Na parte de fora desses trens haviam gravuras que contavam sobre o que estava ocorrendo em outros lugares do país.
No agitprop, a tática deve ser planejada de acordo com a realidade social pelo qual o país estiver passando. O que nos diferencia de períodos passados é que devemos nos atentar na nossa disputa com o monopólio dos meios de comunicação de massa, que são umas das principais formas de manutenção da desinformação e alienação. Temos grandes exemplos de agitprop feminista na america latina: Os lenços verdes da maré verde, as artes e palavras de ordem do Ni Una A Menos e a musica “violador es tu” criada por ativistas chilenas. Todos esses tomaram a américa latina e foram incorporados por feministas do mundo inteiro virando simbolos internacionais de agitação feminista.
Dessa forma, a agitação e a propaganda são ferramentas de disputa de consciência das mulheres da classe trabalhadora na transformação da realidade que vivemos. A pandemia de 2021 escancarou uma triste realidade: O capitalismo impede que tenhamos nosso direito à vida garantido. No Brasil, a fome e a miséria crescem nas costas das mulheres negras, a pandemia mata cada vez mais pessoas, a violência doméstica e o feminicídio crescem. Apesar de terem sido protagonistas de mobilizações por todo o mundo no último período, as mulheres ainda enfrentam muita dificuldade de se mobilizar e de se organizar atualmente, com todas as condições objetivas colocadas. Nossa oficina permitiu que diversas mulheres pudessem debater como o movimento feminista pode avançar nesse sentido nos temas da violência machista, da legalização do aborto e da educação feminista.
Sobre violência machista, debatemos que muitas mulheres hoje se indignam com casos mais extremos de violência como o feminicídio ou estupro por estranhos, mas que muitas tem dificuldade de identificar relacionamentos abusivos ou saber quais recursos públicos, como CRAS, CREAS e CRMs, poderiam acionar. Além disso, debatemos que com a intensificação da pobreza e da vulnerabilidade das mulheres, e em especial das mulheres negras, a violência vai aumentar. Dessa forma debatemos ações de conscientização sobre os direitos das mulheres, como a colagem de lambes em lugares de movimentação permanente, como supermercados, padarias e transportes públicos, e com intervenções nas redes sociais como instagram – formas de agitação. Além disso, debatemos a importância da solidariedade entre mulheres para o combate a violência, com espaços de conversa entre nós, e mesmo cursos de formação – formas de propaganda.
No debate sobre a legalização do aborto foi essencial o entendimento do contexto, da cidade, dos bairros, para pensarmos em estratégias realmente eficazes de diálogo com as massas. Uma companheira residente de cidade no interior trouxe inúmeras preocupações sobre a exposição das mulheres que realizam o procedimento do aborto, visto que só há um hospital na região e todos os moradores se conhecem. Com isso, concluímos que a formação de redes de apoio e grupos de escuta é essencial para que as mulheres consigam superar esse momento, ajudar umas às outras e enxergar que muitos dos problemas que parecem individuais na verdade são estruturais e coletivos. Além dos grupos de escuta e diálogo, também consideramos como um passo importantíssimo e inicial que hajam palestras e divulgações acerca do tema, esclarecendo e quebrando muitos estereótipos que rondam o aborto legal, seguro e gratuito enquanto direito. Sintetizando nossos debates, chegamos em algumas ações como palestras em espaços públicos de saúde e escolas, atividades de diálogo em espaços públicos, como praças, que possam despertar o interesse de transeuntes, intervenções em semáforos da cidade, panfletagens, criação de um jornal com periodicidade constante, além de pautas frequentes em rádios populares. Pensando no apoio mais individualizado às mulheres, propôs-se criar uma ponte com assistentes sociais que se sensibilizem com o assunto, a fim de criar um número de telefone específico para as pessoas que queiram desabafar e conversar de uma forma que não haja tanta exposição.
Ao discutir educação feminista, conversamos como a escola e a universidade, muitas das vezes, são ferramentas de manutenção do patriarcado. Para transformar essa realidade, precisamos ocupar esses espaços e dialogar com estudantes e funcionários. Nosso coletivo pode oferecer orientação para que mulheres organizem redes de apoio e coletivos em suas instituições de ensino. Por entendermos que homens e meninos tambem devem ter uma educação feminista, foi pensado a organização de cineclubes, rodas de conversas, oficinas de artes e panfletagem para todo o publico não só dentro das escolas, como tambem nas praças proximas a essas instituiçoes. Também consideramos fundamental um processo permanente de formação e educação política interna para que estejamos sempre com os debates atualizados e podermos contribuir melhor nos espaços que estivermos presentes.
A construção de um feminismo antirracista e anticapitalista posssui diversos desafios. Aprendendo com experiências anteriores e observando como feministas de países vizinhos se movimentam, podemos reinventar o agitprop nacional nos nossos calendários de luta e em trabalhos de base por todo país.
Referências:
MORENO, Nahuel. PETIT, Mercedes. Conceitos Políticos Básicos. São Paulo, 2010.